Especial DP
E quem dorme ao relento?
Contingente prefere não ir para abrigos; pelo menos uma ou duas pessoas por semana aceitam passar a noite fora da rua nas noites frias
Jô Folha -
A prefeitura intensificou a ronda noturna nas últimas semanas, tendo em vista as baixas temperaturas registradas - na sexta-feira, a mínima em Pelotas chegou a 3ºC. Apesar das várias abordagens feitas todas as noites, somente entre uma e duas pessoas por semana aceitam o convite para pernoitar na Casa de Passagem do município. A maioria prefere dormir ao relento a ir para um local abrigado, onde existem regras. Mesmo que faça muito frio, é feita esta opção.
"A rua é muito boa pela liberdade, a gente faz o que quer e não tem hora para nada", diz Douglas, 26. Ele mora embaixo da marquise do Esporte Clube Pelotas desde os seis anos, segundo conta. "Aquela lá é a minha casa. A cama mais arrumada é a minha", aponta. De fato, o lado mais ajeitado é o dele. Garante que não passa frio. Tem colchão e seis cobertores. E admite não aceitar o convite da prefeitura. "Tem que acordar cedo lá e eu não consigo. Meu problema é esse. Fico a noite toda acordado, cuido carros e ajudo nuns lanches. Todo dia trabalho até umas 4h30min, depois vou dormir. Só de vez em quando que eu faço uma bobagem", conta. Douglas tinha família, mas foi abandonado pelos pais e deixado com uma tia. Acabou fugindo. Há poucos dias foi convidado por uma jovem para ir a uma igreja. "Acho que vou com ela", diz.
O jovem é apenas um entre tantos moradores de rua. Nem todos têm a organização dele e não raro são vistos dormindo apenas em um papelão, com uma coberta fina. E, se as baixas temperaturas já castigam quem está em casa, dormindo em ambiente aquecido, pior para quem está ao relento.
A reportagem do Diário Popular tentou conversar com outros moradores de rua, mas apenas o simpático Douglas se dispôs. Os demais até falaram por debaixo das cobertas, mas acabaram pedindo para não serem mais incomodados, porque estavam com sono. Uns pela manhã, outros à tarde. De acordo com o secretário de Segurança e Justiça Social, Luiz Eduardo Longaray, quando chegam na Casa de Passagem as pessoas tomam banho, jantam e dormem. No outro dia pela manhã recebem café e são liberadas. Muitos passam ao longo do dia por atividades no Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop).
Os riscos
Conforme o médico Ramiro Curi de Lemos, pessoas que dormem na rua estão expostas às mais diversas doenças, principalmente as respiratórias, por ficarem expostas ao frio. São alvo fácil também para tuberculose, problemas de pele, doenças sexualmente transmissíveis e distúrbio de sono. Com as baixas temperaturas, se não estiverem devidamente agasalhadas e aquecidas, ainda correm o risco de hipotermia, que ocorre quando a temperatura do corpo baixa, além de isquemia cardíaca.
O casal Simone e Silmar, ela professora, ele produtor rural, costuma distribuir sopa ou outros tipos de alimentos à noite para pessoas de rua, sempre que pode. "Quem ajuda recebe uma graça. Todos poderiam ajudar. Às vezes as pessoas reclamam da vida e não olham a situação dessas pessoas", diz Silmar, que opta por não revelar o sobrenome de ambos. "Muitos fazem vista grossa e nunca se sabe se uma pessoa de rua não vai nos ajudar um dia. Precisamos uns dos outros", completa ela.
Albergue Noturno precisa de alimentos
O Albergue Noturno Adolfo Fetter abre todos os dias às 18h30min para receber pessoas que não tenham onde dormir. Mas lá também existem regras e é preciso apresentar documentação. A capacidade atual é para 40 abrigados, pois dois quartos estão desativados devido à umidade. Não há recursos para a obra. A renda com as contribuições de associados, a única que tem, não passa de R$ 500,00.
Segundo a responsável pela instituição, Sônia Monteiro, no inverno a procura aumenta consideravelmente e a necessidade atual é de alimentos. Cobertores a casa tem. "A comunidade é muito generosa com a gente, mas precisamos de reforço para a janta e o café", afirma. Quem quiser colaborar pode entrar em contato pelo telefone (53) 3222-7395.
Números da prefeitura
A ronda noturna é feita todas as noites a partir das 23h.
- Pessoas recolhidas - Uma a duas por semana
- Pessoas acolhidas (que vão de forma espontânea) - 15 a 20 por noite
- Capacidade da Casa de Passagem, situada na rua 3 de Maio, 1.087 - 26 leitos, mas se o número for superior, os excedentes são levados para outros abrigos municipais
Albergue
Situado na rua Padre Felício, 320, também oferece banho, janta e café da manhã.
As regras
- É preciso apresentar documento e folha corrida de bons antecedentes
- A pessoa não pode estar drogada ou alcoolizada
- Não pode ter transtornos mentais
- Deve ter entre 18 e 60 anos
Carregando matéria
Conteúdo exclusivo!
Somente assinantes podem visualizar este conteúdo
clique aqui para verificar os planos disponíveis
Já sou assinante
Deixe seu comentário